Torrentes Espirituais – Jeanne Guyon

Pequeno excerto extraído (mais precisamente o capítulo 4) de sua obra clássica “Torrentes Espirituais” de Jeanne Guyon. Você pode adquirir o livro por esse link aqui

Torrentes Espirituiais

CAPÍTULO 4

O terceiro cristão é aquele que se desloca das montanhas como uma torrente. Ele tem sua origem em Deus. Nada o detém. Ele se movimenta com uma audácia que infunde medo ao mais destemido cristão. A pessoa que estou descrevendo neste terceiro estágio parece desfrutar extraordinários relacionamentos com a providência divina. Os eventos que ocorreram em sua vida são extremos e violentos. Ele é desordenado em seus caminhos. Algumas vezes passa por terreno não firme e se contamina. Em outras ocasiões fica perdido nos profundos leitos subterrâneos, e não é descoberto por consideráveis distâncias. Então ele pode emergir por breve momento, para depois ser consumido numa outra caverna.

Finalmente chega ao mar, e lá fica em seu estado mais feliz, pois é por ele absorvido, para nunca mais se encontrar a si mesmo. Torna-se parte do próprio mar; e enquanto no outro rio poderia chegar a carregar grandes mercadorias sobre si, aqui, como parte do mar, ajuda a segurar os navios maiores que navegam pelo oceano. Sua capacidade é ilimitada, pois é parte do próprio mar.

Antes os navegadores não poderiam fazer uso dele enquanto era uma torrente. Agora está perdido, a olhos visíveis, no mar.

Gostaria agora de traçar a experiência e o curso desse rio (desse cristão) a partir do momento de sua conversão até o instante em que se perde no mar. Que processo ele segue, e por quais estágios se movimenta em direção ao Senhor? Quais são os aspectos de sua aventura rumo ao mar?

Se você for esse cristão, sua origem é Deus. Ele é também seu fim. No princípio você é controlado pelo pecado. Seu coração está em permanente movimento, não consegue encontrar repouso, pois este está somente em Deus. Se você estiver buscando descanso em sua vida, nunca irá encontrá-lo senão no Senhor. Sua busca, então, deve ter o fim em Deus. Você notará que o fogo está muito ativo nas margens de fora, porém sua origem é a luz.

No momento em que o pecado cessa de detê-lo você pode correr para encontrar o Senhor. Se você pudesse ficar livre do pecado – o que não é possível –, quão mais rápido alcançaria seu destino! Quanto mais próximo você está de Deus, maior é sua velocidade, e mais tranquila a corrida.

Você tem um fogo e está continuamente colocando madeira sobre ele, fazendo-o aumentar ainda mais. Há obstáculos que devem ser removidos. Por sua própria natureza você está inclinado ao Senhor. Se não fosse pelos obstáculos, você correria incessantemente em direção a Ele.

Se você está pecando desnecessariamente, você está impedindo seu progresso em direção ao alvo.

Você avançará pouco ou muito de acordo com os obstáculos que coloca em seu caminho.

Mas aqueles cristãos que se consideram bons pelo fato de não terem conhecido muitas fraquezas têm também muitos problemas. Tome, por exemplo, alguém que fez voto de celibato. Esteja atento, para não fazer da pureza seu ídolo.

Lembre-se de que o Senhor faz com que as suas misericórdias superabundem onde o pecado tem abundado. Tenha cuidado, para que não a própria justiça. Este é um obstáculo do qual é mais difícil livrar-se do que os maiores pecados.

Você nunca conhecerá o centro de Deus por uma visão exacerbada de si mesmo.

A barreira é simplesmente imensa. Você não deve nutrir nem forte afeição pelo pecado, nem pela própria justiça.

Uma das primeiras coisas que o Senhor faz por você é dar-lhe o entendimento de que está afastado d’Ele. Isso faz com que você esquadrinhe o mais profundo do seu ser, à procura da existência de pecado em sua vida. E muitas vezes você se aflige com grande angústia e dor, em razão dele. Você pode vislumbrar esse lugar remoto de descanso, contudo ele apenas lhe aumenta a inquietação. No entanto, ele também lhe aumenta o desejo de perseguir esse repouso.

Você pode descobrir que irá neste ponto começar a procurar algum meio para tocar internamente o Senhor. Isso pode levá-lo a se voltar para um tipo de oração mais objetiva; a meditação ou muitas outras adaptações e exercícios cristãos. Você encontrará provavelmente tudo que está querendo, e esta aventura servirá unicamente para lhe atiçar ainda mais o desejo de conhecê-lo melhor. E se lhe acontecer ser bem-sucedido em qualquer que seja a sua tentativa, você deve entender que tem apenas abrandado, não curado essa doença. Se você tentar combater a situação, somente fará com que sua impaciência se redobre.

Se um cristão nesse estado não encontrar alguém que o ajude ao longo do caminho, ele perderá muito tempo. Mas fique certo de que o Senhor, em sua providência, fará com que seja transitório. Ele passará, de um modo ou de outro. Ele vai ao encontro da necessidade desse cristão.

E geralmente ele o faz, não de um modo extraordinário, mas de uma forma muito natural.

Algumas vezes, ao tentar guiar esse cristão a fim de que conheça melhor o Senhor, a pessoa pode esperar conseguir isso valendo-se de sua habilidade natural. Geralmente esse cristão acaba descobrindo sozinho, com espanto, surpresa e satisfação, que possui dentro do próprio ser o tesouro que havia muito vinha buscando. Ele constata que a oração não tem de ser custosa, algo enfadonho e se regozija com a liberdade descoberta.

Ele vai ao profundo de seu ser e lá encontra o Senhor. Descobre indescritível prazer, que o faz prosseguir. E deseja permanecer nesse estado (de amor e habitação secreta) para sempre.

Eu chamaria a atenção aqui para o fato de que, por mais prazeroso que possa parecer, o cristão não está, contudo, lidando com alguma coisa com a qual não esteja bem familiarizado. Ele é fervoroso e cheio de amor. Sente-se como se estivesse no paraíso . Descobriu dentro de si uma coisa mais doce que todos os prazeres da Terra, e está disposto a esquecer as coisas deste mundo a fim de apreciar suas experiências mais secretas.

Sua oração se torna quase ininterrupta. Seu amor aumenta dia após dia. Tudo o que o oprimia desaparece. Havendo abandonado seus próprios desígnios, aceitaria perpetuamente o amor de Deus, e não permitiria interrupções. Isso é, na verdade, um sinal de sua fraqueza. Ele tem receio de conversar; de envolver-se em qualquer tipo de negócio com outras pessoas. Mantém um relacionamento frágil com o Senhor, e teme a possibilidade de se dispersar facilmente.

Se cai em pecado, sempre o julga muito sério, impõe a si mesmo a mais pesada repreensão, e se reprova por uma palavra supérflua ou pensamento vão. O que podemos dizer a esse respeito é que compete unicamente ao Senhor continuar seu trabalho nessa alma, e purificá-la.

Se o que parece é que o Senhor deixou esse pobre cristão , ele é consumido em confusão. Mas uma vez restaurada a comunhão, ele passa a exortar a todos a amar a Deus.

Alguns fechariam os olhos e ficariam cegos e surdos nesse estado, de modo que não poderiam esconder a imensa alegria. São como pessoas embriagadas com vinho. Ler uma só linha é suficiente para que recebam iluminação; levaria um dia inteiro ler uma única página. Uma palavra do Senhor lhes desperta o instinto, inclinando-os a Deus, que lhes inflama o coração.

Neste ponto, a oração objetiva e oral simplesmente não é algo que o cristão aprecia. Alguns ficam confusos quanto ao motivo de não mais poderem orar. Eles sabem que simplesmente não conseguem orar com a boca. Alguma coisa doce e adorável os faz ficar em silêncio.

Procurar agora ser objetivo na oração ocasionaria a perda de sua paz celestial, e introduziria uma sensação de sequidão.

Se o cristão está atravessando este estágio (esta torrente que o mergulhou em Deus), não embarace, tentando motivá-lo ao exercício da oração oral e objetiva. Ele se torna extremamente sensível ao pecado; quando o sofrimento chega à sua vida ele não tem nenhuma oração dentro de si, que o faça suplicar por seu fim.

Se você lhe perguntasse a respeito da sua experiência atual, ele certamente lhe contaria que alcançou o centro de Deus, e que está tranquilo e satisfeito com o Senhor que acredita haver alcançado o estágio final – o cume da montanha. Ele não vê nada mais para fazer, a não ser deleitar-se no estado em que se encontra.

Muitos cristãos acreditam que este é verdadeiramente o alvo final de Deus para nós, e proclamam o evangelho deste modo.

E quanto tempo dura este estágio na vida do cristão? Talvez um longo período. Há cristãos que jamais chegaram a um ponto além desta experiência. Eles são algumas vezes admirados por toda humanidade.

É verdade que o cristão neste estágio vivenciará curtos períodos de sequidão. Todavia, isso não o fará retroceder, mas tão somente o impulsionará para a frente e para o alto. Contudo, ele está feliz, em deleite no Senhor e no suprimento espiritual de Deus. Mas observe o seguinte: se fosse você a pessoa destinada a remover este estado da vida desse cristão, ele iria se sentir como se houvesse caído numa desgraça irreparável.

Tradução de: Ana Maria Petitinga Lanees

Livro “The Works Of Madame Jeanne Guyon” – Versão kindle; este livro contém 7 obras de Jeanne Guyon das mais conceituadas. entre elas ‟Spiritual Torrents”, do qual coletamos este breve texto, além de sua autobiografia, suas cartas, poemas, sua análise sobre cântico dos cânticos, entre outros, totalizando ao todo 7 obras.  Saiba Mais.

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