Teodiceia Poetizada

Só a Trindade havia1

E em harmonia2 ela sorria;3

Mas porque os homens,

Imaginaram coisas vãs?4

 

Mas não se deu só com eles

O vil pensamento da criação;5

Pois antes de Adão o primeiro,

O querubim, um luzeiro6

Se encheu de profanação.7

 

E em seus anjos de valor,

Deus tolices contemplou8

Pois surgiu a tal pergunta:

“Há algo bom além do Amor?” 9

 

Mas o Amor dá liberdade;

Que se mostre a verdade

Do que se passa nos corações;10

Não se impõe arbitrariamente,

Pra que julgue retamente

Mil vontades e decisões.11

 

Há um tempo para a escolha12

Mesmo da que não se compense;13

Pois é divinamente hilária14

A convicção descrente.

 

Pois o tempo se perdura,

Só ate amadurecer15

As convicções futuras

Que Deus já está a antever.

 

A justiça se vindica

No caminho do amor

Deu a chance Ele a todos;

Só então depois julgou.

 

Pois por ser o bem supremo,

Só ao bom Rei constituirá

Com poder absoluto

Para todos governar16

 

Na espera está provando

Que qualquer caminho é vão,17

Se não toma por modelo

O bom Rei de perfeição.

 

E em tempo adverte:

Venham já se arrepender;

Sem se sujeitar ao Filho

Todos ireis perecer.18

1 Jo. 1:1

2 Aqui, a palavra harmonia, sugere o conceito de Pericorese. Transcrevo a seguir, um valioso texto publicado por um servo do Senhor que explica o conceito teológico da palavra Pericorese:

“É necessário definirmos o que é Pericorese. Essa palavra foi usada pela igreja primitiva no período patrístico para ajudar a entender a relação de amor, entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. A palavra grega se compõe de três radicais: “Peri” quer dizer “ao redor”, como periferia ou perímetro. A palavra: “chorea” de onde provém o a parte central da palavra Pericorese, significa “dança ou estar de frente” como o coro de cantores que fica de frente para a plateia. E, finalmente, a última parte: “esis”; significa “decorrência”. Algo que jorra de uma fonte. Os cristãos do Oriente, entre os chamados “Pais da Igreja” de língua grega construíram assim, uma figura interessante, pois eles chamam a comunhão da santíssima Trindade e da humanidade redimida, de uma espécie de harmonia viva; eles a comparam como uma dança. Uma dança de crianças, como uma brincadeira de dançar rodando e se colocando em vários círculos que enquanto giram de forma dinâmica, se revezam entre estarem hora no centro da roda, hora no seu lado mais periférico. E eles dizem que a Trindade baila, dança por todo o Universo e por toda a eternidade. Também dizem que a Trindade abre espaço para participarmos dessa dança. A igreja como uma virgem pura é convidada a participar dessa dança. A figura que me vem à mente quando estou lendo os teólogos ortodoxos do oriente, é que Deus cria o Universo, também Ele nos cria neste Universo. E aquilo que Deus cria não é da mesma natureza Dele, mas o Filho de Deus, Ele se esvazia da Sua glória, mergulha no Universo para buscar você e a mim, e nos levar para junto da unidade entre o Pai e o Filho e o Espírito Santo, para essa brincadeira de roda, para essa ciranda da eternidade. Jesus orou por isso em João 17:20-21 “Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste”. Pericorese trata de comunhão relacional das três Pessoas da Santíssima Trindade, de um movimento de amor e graça para com toda a criação. Para ilustrar de outra forma, podemos dizer que numa dança de três, uma pessoa não pode liderar as outras duas. Antes, todas as três se movimentam como se fossem uma só, uma respeitando a outra, e nenhuma delas tendo supremacia sobre a outra. É assim que funciona a Trindade. Vejamos o texto que expressa a Pericorese: “Não crês que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, faz as suas obras. Crede-me que estou no Pai, e o Pai, em mim; crede ao menos por causa das mesmas obras” (João 14:10-11). A Trindade é a compenetração das pessoas, é um recíproco estar no outro. Esta ação de amor não está fechada em si, mas aberta a toda Criação e este deveria ser nosso estilo de viver. O mundo não é dividido, mas diversificado. A Trindade não é dividida, mas há uma diversidade de Pessoas e essa simbologia nos desafia a viver uma espiritualidade inclusiva, interativa, cooperativa ao aceitar o outro, sem querer dominá-lo ou excluí-lo. Essa compreensão sobre a Trindade nos aproxima do mistério trinitário e amplia nossa concepção sobre o semelhante promovendo respeito, cumplicidade e identificação. Como ainda está expresso em João 17:22-23: “Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim”.  (Adaptado do texto PERICORESE – A DANÇA DA TRINDADE. Da autoria de Cláudio Morandi. O texto pode ser encontrado no site: www.webservos.com.br

3 Pv. 8:30-31

4 Sl. 2:1; 94:11

5 Is. 14:13-14

6 Is. 14:12

7 Ez. 28:15-16

8 Jó. 4:18 – Tradução segundo a versão King
James Atualizada em Português: “Deus não deposita confiança em seus próprios
servos, e consegue perceber erro em seus anjos e os julga por insensatez”.

9 Esta pergunta está sempre implícita na forma como Satanás tenta distorcer o caráter de Deus ao tentar o homem no Éden.
Acaso, não percebemos isso na forma como ele tenta fazer parecer para Eva (Gn.3:1-6), que Deus na verdade não é bom, e que tem más intenções para com os pais da raça humana? E seria demais que sugeríssemos que isso sempre foi o meio de ele enganar e distorcer o amor divino não só para os homens no plano terreno,
mas também para os anjos e demais seres celestes nos pavilhões celestiais? É o que parece ficar claro quando lemos o primeiro capítulo do livro de Jó, que no Conselho de Jeová com os filhos de Elohin, Satanás também se apresenta ao Deus soberano, e quando exposto pela pergunta daquele para quem todas coisas estão patentes e descobertas (Hb. 4:13), ele então ao mesmo tempo que ataca o caráter de Jó, de maneira sutil também sugere dúvidas quanto a pureza do amor de Deus para com o patriarca (Jó 1:6-12). Isso levanta perguntas no coração da corte celeste. Perguntas que Deus já conhece desde antemão. E acaso tais perguntas teriam a ver apenas com o tempo do Éden, e do patriarca Jó, ou já teriam sido desde o primeiro momento da rebelião de Lúcifer, acesas no coração daquele um terço de anjos que ele levou consigo? Os quais não só duvidaram mas se uniram à sua rebelião e agora são chamados de anjos do diabo, e anjos do dragão (Mt.25:41; Ap. 12:9)? Parece provável que tenha sido isso que aconteceu. E podemos embasar essa probabilidade em um texto que sugere a queda do querubim protetor no livro de Ezequiel. Falando da queda do querubim glorioso, Ezequiel diz: “Na multiplicação do teu comércio, se encheu o teu interior de violência, e pecaste; pelo que te lançarei profanado, fora do monte de Deus e te farei perecer, ó querubim da guarda, em meio do brilho das pedras” (Ez. 28:16). Em seu clássico livro “As Eras Mais Primitivas da Terra” Pember nos diz que a palavra “comércio” no início deste versículo, pode ser traduzida mais corretamente como “calúnia” ou “difamação” acordo com o original hebraico. Difamar, é macular a honra de uma pessoa. Caluniar é contar mentiras a respeito da conduta de alguém. Então, aqui temos a prova do que até agora só podíamos conjecturar. Ou seja, Satanás realmente plantou duvidas mentirosas a respeito do amor divino, desde o início de sua queda.

10 Dt. 8:2; 13:1-3; 30:19

11 Rm. 3:4-6; Sl. 51:4; Ez. 18:23-30

12 Is. 55:6-7; At. 17:30-31; 2Co. 6:2

13 Mt. 23:37; cf. Ap. 2:21

14 Sl. 2:2-4

15 Gn. 15:16; Ap. 14:14-20 –No caso de Ap. 14:14-20, são mencionadas duas colheitas. Uma do diz respeito aos se posicionaram por Deus e que amadureceram dentro da obediência à vontade divina. Esses são o trigo; os filhos do reino. Eles são ceifados pois todo o trabalho de Deus ao longo do tempo no tocante a eles finalmente alcançou o ponto máximo; o ponto culminante que se assemelha à plena maturação dos frutos para a colheita. A outra é a colheita dos que dentro da raça humana, amadurecerem a maldade do mundo, enchendo a medida tolerada por Deus, como uma videira maligna carregada de uvas suculentas em perversidade e em rebelião à vontade divina. Essa colheita é feita reunindo todas essas “uvas” no lagar da vindima da ira do Deus Todo-poderoso; o Armagedom. É necessário que Deus deixe as convicções de suas criaturas amadurecerem dessa forma, que se definam as posições, e que cada coração tome posição pelo partido divino ou pelo partido satânico, para que acima de tudo, Deus seja manifestado como Justo no seu juízo sobre as criaturas. Pois ele dará a cada uma, aquilo que em seus corações elas tiverem escolhido. Como C. S. Lewis observa em seu livro “The Great Divorce” (O grande Divórcio – traduzido como “O grande Abismo” na versão em língua portuguesa): “No fim de todas as coisas, só restarão apenas dois tipos de pessoas e apenas duas opções. Haverá aquelas pessoas que dirão a Deus: “Seja feita a tua vontade” e aquelas a quem Deus terá de dizer: “Que seja feita a vossa vontade” – Todas que estiverem na glória escolheram a primeira opção. E todas que estiverem no inferno, terão escolhido a segunda. Mas tudo será por escolha! Nenhuma alma que tiver ao menos só um pouco desejado de verdade o céu, se achará no inferno”. Isso é solene, maravilhoso e assustador ao mesmo tempo! Pois indica que se o céu, a glória divina, é uma questão de escolha, o inferno por mais estranho que possa parecer, também será uma questão de escolha! E assim, Deus será amoroso e justo ao mesmo tempo. Amoroso porque honrou o direito de escolha de suas criaturas. O amor respeita a escolha do próximo, mesmo que essa escolha entristeça o coração de quem ama. Pois o amor “não procura os seus próprios interesses” ou como diz a tradução da NVT Nova Versão Transformadora: “O amor não exige que as coisas sejam feitas à sua maneira” (1Co 13:5). Para aquele que não quiser a vontade divina, tudo o que poderá restar é o inferno. Não porque Deus seja mal. Mas é porque não é possível ele nos dar felicidade fora da sua vontade! Visto que a vontade de Deus é a única fonte de verdadeira felicidade que existe! Como o próprio Lewis diz ainda: “Deus não pode nos dar felicidade separada Dele mesmo, pois essa forma de felicidade simplesmente não existe!”. O prazer infinito, a alegria eterna, estão em Deus mesmo. Esse Deus a quem os santos e teólogos do período escolástico, chamavam de “O Sumo Bem”, não pode nos dar o “bem” sem dar-se a si mesmo e sem nos fazer participantes de sua boa vontade. O inferno em sua maior definição, é o sofrimento eterno, gerado pela perda de tal Bem supremo. Mas por mais estranho que pareça, essa perda será por escolha, alguns preferirão o inferno ao invés da Felicidade infinita. E portanto hão de obtê-lo! Pois tais pessoas preferirão, seguindo o pensamento do diabo, “reinarem livres no inferno, ao invés de terem de servir e obedecer no céu” como nos diz John Milton em “Paraiso perdido”. Deus também estará sendo justo com cada uma de suas criaturas. Pois estará apenas manifestando e dando a cada um, aquilo que o próprio coração do indivíduo desejou. Assim, naquele dia em que ele manifestar os segredos dos corações diante de seu santo julgamento (Rm. 2:16; Ec. 12:13), ele não somente manifestará quão justo ou injusto é cada um diante Dele, mas cada um dos que forem julgados verão quão justo é Deus em seus juízos e caminhos! E assim, toda boca se calará; Deus será vindicado e inocentado no coração de cada criatura! Elas verão que ele não teve culpa de nenhum mal que aconteceu; de nenhuma injustiça que muitas vezes atribuíram a Ele. E verão que “sem causa o haviam odiado” (Jo 15:25). Nessa hora se cumprirá aquilo que está registrado nas Escrituras sagradas. Pois nela está dito que no dia em que Deus vier julgar as boas e más ações de cada uma de suas criaturas, “Será provado, se tornará manifesto que Ele tem razão no que diz; e ele prevalecerá e será tido por justo no dia do julgamento” (Rm. 3:4). E assim, ele será glorificado, e nunca mais sua vontade será mal interpretada por nenhuma de suas criaturas e por nenhum de seus anjos e de seus filhos.

16 Sl. 2:7-9; 110; Fp. 2:9-11; 1Co 15:24-28

17 Hc. 2:13-14

18 Sl. 2:10-12

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Daniel de Queiroz Moraes

Pods DoPeregrino.com

Série: Isso não vem de Vós Ep03

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