O Sacrifício da Visão, Como devemos lidar com nossos olhos em tempo de Grandes Trevas – Marcos 9.47
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A vida de consagração por vezes pode parecer sacrificante, e o cristão tem que tomar medidas drásticas. Houve alegorias do Senhor que serviram para nos dizer o quanto deveríamos estar dispostos a uma separação a fim de ter uma vida singular diante d’Ele. Vez por outra, o Mestre nos ensinou que deveríamos “remover os olhos”, pois se tais ou um dos tais nos faziam pecar, era melhor ficar sem um deles do que, tendo os dois, sermos lançados debaixo de disciplina aguda do Senhor.
“Se o teu olho te servir de pedra de tropeço, arranca-o; melhor é entrares no reino de Deus com um só de teus olhos, do que, tendo dois, seres lançado na Geena”
[Marcos 9.47 – tb].
Certa vez, João mencionou que havia alguém expulsando demônios que não era parte do seu grupo, ou seja, nem dos Doze e, provavelmente, nem dos Setenta. Essa pessoa não era considerada um dos discípulos, mas Jesus identificou-se com esse expulsor de demônios, mesmo que João não o fizesse; pois Jesus afirmou: “Ninguém pode fazer isso e, ao mesmo tempo, falar mal de mim” (Marcos 9.39), e ainda: “Quem não é contra nós (Cristo Místico: a Cabeça e o Corpo) é a favor de nós” (Marcos 9.40). Além de todas essas palavras que incluíam esse irmão fora dos Doze e dos demais discípulos, ainda nos reservaria uma palavra muito poderosa:
“Pois aquele que lhes der de beber um copo de água, em meu nome, porque vocês são de Cristo, em verdade lhes digo que de modo nenhum perderá a sua recompensa.”
—Marcos 9.41 – naa.
Jesus quis dizer claramente que aquela obra de expelir espíritos iracundos era como dar água aos Seus discípulos, pois os ajudava, embora fosse uma ajuda — muitas vezes tida como — pequena, ou não vista, por não estar no rol dos mais notáveis; contudo, havia alguém que dava água a eles sem eles perceberem, de outro modo aquele trabalho de expulsão demoníaca deveria cair sobre o ombro de entre eles.
Quantos copos d’aguas desconhecidos serão revelados naquele Grande Dia. Como muitos notáveis certamente se encontrarão envergonhados.
Quando somos rápidos em negar as ações de alguém por não pertencer ao nosso grupo, isso nos torna sectários ao ponto de querer impedir, não que alguém “expulse demônios”, mas que sejamos, na verdade, saciados por uma água fria, bem-vinda, naquele calor escaldante de nossos “desertos”.
Jesus, nosso Senhor, repreende agudamente João, dizendo que aquilo poderia ser semelhante a causar tropeços em pequeninos (Marcos 9.39, 42).
Depois no versículo 43 ainda em Marcos 9, Jesus nos ensina que devemos alijar determinados membros usando uma linguagem metafórica, creio que a análise disso seja inevitável:
“Se a tua mão te servir de pedra de tropeço, corta-a; melhor é entrares na vida manco do que, tendo duas mãos, ires para a Geena, para o fogo inextinguível.” (Tradução Brasileira).
Após o Senhor repreender João, Ele fala nestes termos simbólicos; tão simbólicos ao ponto de se confundir com aquilo que é de mais real.
O que é necessário para viver como se estivesse com uma das mãos cortadas? Negando-a. Ela definitivamente denota um simbolismo de pecado; alijá-la é fundamental na peregrinação aqui nesta terra.
Já no versículo 45, nosso Senhor trata com os pés. Certa vez, nosso irmão Watchman Nee disse que a punição em nossos membros caiu sobre JESUS; suas mãos e pés foram cravejados no nosso lugar para que tivéssemos um caminhar e mãos santos, sua cabeça foi ferida com a coroa de espinhos para que tivéssemos uma mente sã.
O que acontece com o não cumprimento dessas negações? Seríamos depositados na GueHenna. Obviamente que não é o Inferno, afinal, Jesus estava lidando com discípulos dos quais Ele mesmo disse que não havia se perdido e jamais poderiam se perder, pois estavam guardados sob Sua proteção; logo, se algum deles se perdesse a culpa recairia sobre nosso Senhor, pois Ele não teria guardado àqueles que não deveriam se perder. No entanto, em meio a isso, queremos destacar a exceção do filho da perdição, é claro.
Mas, se nenhum deles se perdeu, por que então Jesus ensina que se tivéssemos tropeços estaríamos sendo colocados em um lugar chamado: GueHenna (Geena na Tradução Brasileira, Inferno nas Bíblias Almeidas)?
Porque tal lugar não é para condenação eterna; não se condena justificados, mas, na verdade, se trata com eles no comportamento de família.
Conforme Lucas 13, alguns iriam ver o Reino de Deus, mas não entrar nele; a Bíblia confere destaque até mesmo da capacidade que eles teriam de reconhecer Abrahão, Isaque, Jacó e todos os profetas no Reino, mas tendo eles ficado de fora. Chorando e rangendo os dentes.
Se lermos atentamente essa porção perceberemos que se trata da passagem da parábola do dono da casa, o fato deles entrarem na casa e se alimentarem com o dono dela é que eles pertenciam à casa, todavia, tiverem comportamentos levianos na vivência com Senhor da “Casa”. Fizemos um estudo com detalhes dessa porção, creio que valha muito a pena ler.
Contudo, nosso foco neste momento não é discutir o quanto o Senhor nos disciplina, mas, sim, o quão perigoso é flertarmos com o pecado. Há uma canção de Michael W. Smith chamada “Go West Young Man”. Que diz para o homem jovem fugir para o oeste caso o mal estivesse no leste. Porém, às vezes não fugimos da aparência do mal, mas vamos ao seu encontro. Tal conduta obrigará Deus lidar conosco sem dúvida nenhuma.
Os instrumentos usados para que sempre nos aproximemos do pecado — ou como (num sinal de alerta aos jovens) diz Paulo a Timóteo: “Paixões da Mocidade” — são mãos e pés; mas não somente aquilo que pego, toco e sinto, assim como aquilo que me leva e me locomove ao lugar que não deveria estar, pois meus pés foram julgados em Cristo na cruz.
Mas também há outro membro que afeta toda nossa trajetória cristã. Os olhos. O instrumento que me aproxima de muitas coisas, ainda que não esteja presencialmente perto delas.
Os nossos olhos são a vitrine da alma; eu diria um portal, que não afeta diretamente a alma, aliás, sim; mas, seu foco é, primeiro, tornar todo o corpo do homem mau. Se Satã conseguir que, ao menos, um de nossos olhos se enverede para o mal, ele poderá contaminar todo nosso corpo mais tarde e assim neutralizar a obra de Deus.
Um dos Olhos e não Necessariamente os Dois
Analisemos a palavra: μονόφθαλμος, essa palavra grega transliterada fica assim: “monofthalmos”; que por sua vez quer salientar que alguém ficou com apenas um dos olhos enquanto o outro foi danificado.
Monofthalmos é uma palavra importante, pois na linguagem bíblica esse texto está dizendo sobre o conflito dos próprios olhos, um nega as coisas deste mundo; o outro, provavelmente, as procura. Essa palavra aparece em Mateus 18.9 ao dizer que se um dos olhos é como pedra de tropeço, logo, devemos “arrancá-lo”.
Tanto Mateus 18.9 quanto Marcos 9.47 nos revelam detalhes muito importantes; o primeiro deles é que há um “se”, ou seja, danificar um olho só deveria ser considerado, caso um deles tivesse causando tropeço ou sendo mau. De outro modo, não seria necessário ir até às últimas consequências, o que indica que pode haver filhos de Deus que não tenham problemas com esse órgão duplo, mas caso tiver, tratar com ele de forma drástica será necessário.
O segundo detalhe é que esse texto citado menciona olhos, porém também mãos e pés, assim se o problema não for o olho, poderá ser mão ou pé, ou, mesmo, todos eles em conjunto, sendo necessária uma aguda ação do discípulo de Cristo.
Essas questões devem ser observadas pelos cristãos, pois tais detalhes são de grande importância; há pelo menos 3 situações que envolvem a experiência dos filhos de Deus de lidar com o pendor forte da carne nesses membros, vejamos:
- Envolvimento em pequenos detalhes;
- Indicação de uma luta (entre espírito e carne) que é comum no cristão;
- Uma fraqueza vivida pelo peregrino uma vez que foi “mutilado” neste mundo.
Vivendo no Limiar dos Detalhes
Um dos olhos significa que pode não ser algo tão evidente ou mesmo um pecado grosseiro; às vezes pode ser, mas nem sempre será assim; por isso, é mencionado um dos olhos e não os dois.
Quando aceitamos detalhes quase imperceptíveis em nossa visão, seremos posteriormente envolvidos em algo maior, quase insuportável, e cairemos facilmente. Quando lidamos desde cedo com detalhes que consideramos dignos de enfrentar com todo o julgamento que merecem, seremos poupados de algo muito maior depois.
Por isso, nosso Senhor repreende o exclusivismo de João desde cedo, para que no futuro João não se torne uma terrível pedra de tropeço na Igreja de Deus, tratando as pessoas de maneira dura, expulsando outras e atacando o trabalho sincero de ainda outras.
Não é à toa que o que João viria a se tornar mais tarde, carregaria características de uma pessoa tão quebrantada e amorosa, treinada de perto por seu Mestre. Ele aprendeu profundamente sobre o amor, passando a considerar os irmãos mais fracos e frágeis; talvez como aquele a quem ele um dia tentou proibir de expulsar demônios; tratando-os, agora, como “filhinhos”. O Senhor quebrou profundamente este homem que inicialmente parecia um trovão (Mc 3.17), e que depois trataria seus irmãos, que ainda precisavam lidar com seus pecados, de “filhinhos” (1Jo 2.1, 18).
Certamente, João teve que negar mão, pé e olho. Tudo isso convergiu para um homem que aprendeu a amar e aprendeu sobre o amor.
Se deixarmos os detalhes sem tratamento, o olho em treva contaminará o outro, e todo nosso corpo estará debaixo de escuridão, devido aos olhos em trevas.
A partir de então o corpo passa estar licenciado a pecar com todos os seus membros, tanto pecados grosseiros — como o que gosta de olhar para mulher que pertence a outro — até o olhar, do ponto de vista, do exclusivismo (tal efeito já atingiu sua alma), irmãos que agem diferente do “modos operandi” dele, e assim os rechaçamos ou até mesmo, se tivermos condições, proibimos eles de prosseguirem com seus “copos d’agua fria” na seara do Senhor.
Devido a isso, Jesus quer que lidemos com cada detalhe, perturbador ou imperceptível, logo no início. Às vezes são vídeos de internet que alimentamos e que consideremos sem tanta importância. Alguns deles são engraçados, outros mais eróticos e ainda outros mais intelectuais, mas tais são o início do fim. Se eles de fato acusam a consciência e maltratam seu corpo por meio dos flashs que vão e voltam à sua mente, eles devem ser detidos. Hoje, podem parecer inofensivos, mas amanhã, certamente, serão devastadores, assaltando todo o seu corpo.
Certa vez, observava um irmão que lutava contra os desejos homossexuais que ele mesmo, admitindo, os condenava; e queria a todo custo não estar mais envolvimento com aquelas sensações. Outro irmão ao aconselhar procurou saber como ele usava o seu próprio celular. Ao saber em seguida que ele sempre procurava vídeos que os nutria nesta fraqueza, e também ao saber que ele não conseguia abandonar aqueles mesmos vídeos, imediatamente considerou o: “se” [Se teu olho…].
O jovem que o aconselhava, disse que não poderia haver outra solução, devido àquela falta de controle, que não fosse abandonar seu celular; destruí-lo, ou vendê-lo, ou mesmo doá-lo. Em seguida disse para comprar um celular “flip, flop”, que não tinha tantos recursos, propositadamente, e não fosse, assim, usado para o consumo daqueles vídeos. A atitude parece ter sido radical, como seria radical arrancar um dos olhos. Mas seria a única forma, dentro daquela trama, de se obter vitória. Na verdade, neste contexto, se livrar do celular seria como “arrancar o próprio olho”.
Ser forte nem sempre é enfrentar uma dificuldade que quase sempre nos vence; ao contrário, ser forte é muitas vezes abandonar, fugir, reconhecer que em nós não há bem algum que possa dar conta de conviver com algo tão perigoso ao nosso lado.
Às vezes não caímos em pecado, mas muitas vezes flertamos com ele; essa atitude é manter um dos olhos em plena função. Tal detalhe hoje pode estar de alguma maneira sob controle, mas amanhã ele dominará e trará consequências sérias, como escuridão a todo corpo.
A Luta de um Olho Contra Outro
A segunda consideração de ter apenas um dos olhos, e não ambos, é que além dos detalhes que permitimos que convivam conosco, há uma luta entre um olho contra o outro. Suponhamos que um dos nossos olhos queira ver imagens mais fortes ou filmes cujas produções se dedicaram às cenas eróticas e sensuais. Agora, não estamos sendo ludibriados pelos detalhes, ao contrário, está sendo escancarado diante de nós aquilo que podemos perceber ir muito além de uma trama de um bom filme, e sim, cenas de sexo regadas à violência e outros meios que levam nosso corpo a se apegar a tudo isso. O que fazemos? Entramos num estado de luta, o “olho bom” luta contra o “olho mau”.
Podem, também, ser coisas que consideremos de um ponto de vista errado, e tal erro pode estar claro para nós. Mas, enquanto um dos nossos olhos indica algo certo para considerarmos, pois a esta altura já conseguimos ter alguma clareza por percebermos o desejo do olho mau, o outro entra em luta franca, este último batalha para ter o anseio do corpo naquilo que ele vê e considera. E isto se torna uma verdadeira guerra dos desejos do mal e dos desejos do bem. Da carne e do espírito. Da inclinação para o pecado e da busca da santificação.
Algo muito curioso acerca disso está na parábola dos trabalhadores da vinha em Mateus 20. Quando o senhor da vinha foi pagar o salário, ele pagou conforme combinado, todavia ele quis ser gracioso com os que apareceram na última hora dando o mesmo valor combinado com todos os outros trabalhadores, incluindo os primeiros. O que acontece em seguida? Aqueles que trabalharam desde o começo imaginaram que o dono da vinha não daria apenas o que foi combinado, mas ainda mais do que o valor proposto. Afinal, ele, começando a pagar pelos últimos, deu o mesmo tanto para quem trabalhou menos; se imaginaria que os que trabalharam desde o começo ganhariam mais. Aqui há um erro de visão genérica.
Note, esta era a visão. Ela por si só não estaria errada, poderia haver essa probabilidade; afinal ele estava dando o mesmo tanto para os que trabalharam mais tarde, e por trabalharem no final resultou em menos tempo de atuação e ocupação; contudo a probabilidade, se existisse, não seria pautada no acordo inicial, afinal de contas o que foi acordado é o que deveria ser cumprido. Contudo, aqueles que trabalharam mais, ao receberem, perceberam que ganharam exatamente o que foi estabelecido e ficaram, assim, chateados, agindo com murmuração. Mas por quê?
Devido à visão errada que tiveram. Notemos como o Senhor diz acerca deles:
“Ou não me é lícito fazer o que quiser do que é meu? Ou é mau o teu olho porque eu sou bom? ”
—Mateus 20.15 – arc, grifo nosso.
Jesus diz que os primeiros trabalhadores murmuravam por causas dos olhos deles não suportarem a bondade.
Esse sentimento veio da visão, foi o olho da carne clamando. Não houve injustiça porque o combinado foi cumprido. Mas não conseguiram suportar a bondade!
A miopia da visão deles, fazia eles enxergarem apenas a si mesmos; quando tiveram que ver pelo “olho” que já estavam acostumados, foi quase insuportável saber que o dono da vinha cumpriu o combinado com eles e agiu com bondade ou outros trabalhadores. O problema não estava em receberem o que foi combinado, mas em o dono da vinha ser bondoso com os trabalhadores finais.
Note como os crentes em geral tem dificuldade de ver o bom êxito do seu vizinho. Alguns irmãos não suportam ver outros irmãos recebendo graça. Isso na verdade é uma distorção tão desconexa do Espírito Santo, que só faz alguém ser cada vez mais carnal.
O problema retratado na parábola não foi algo grosseiro; foi um defeito da visão. Eles tinham uma visão distorcida tanto de si quanto do administrador da vinha. De si mesmos, pois consideraram que deveriam ser mais bem recompensados e, talvez, que fossem melhores que os outros; do administrador, pois não suportaram a bondade dele.
Se avaliarmos bem, foi algo muito parecido no evento que João tenta proibir àquele que expelia espíritos maus, pelo simples fato de não estar no seu grupo. Ele via aquele homem sobre uma ótica errada. Esses “pontos de vista”, são muito danosos.
Irmãos notáveis que se dividiram, no final de suas vidas, ainda ecoavam tão fortemente “não tenho qualquer mudança no meu ponto de vista”.
Nosso olho espiritual lidará de forma conflitante com nosso olho da carne (note que não me refiro ao olho do corpo). Não estamos agora falando daquilo que vemos pelo membro da visão do nosso corpo, mas do quanto nossa visão carnal aparece para falar mais alto e governar a alma. É um desvio da alma, é um problema psíquico. Geralmente, essa visão não suporta a bondade do Senhor ou o Senhor dar mais graça a um irmão que chegou agora e que está se consagrando. Sendo assim usado como vaso útil ao Senhor. Tais coisas são muito difíceis de serem suportadas por muitos irmãos. Agora estamos diante de uma luta. Não é mais apenas uma questão de detalhes.
A última análise de nossa tríade ocular, aponta mais uma vez para ausência de um dos membros e não de ambos os membros. Repare que o Senhor foi cuidadoso ao aplicar membros duplos, como, por exemplo: mãos, pés e olhos. Ele poderia ter usado a cabeça para retratar maus pensamentos ou a boca pare demonstrar as palavras impuras constantemente despejadas por nós. Mas não haveria qualquer ligação com essa luta e também com as fraquezas que experimentaríamos ao pagar o preço da “mutilação”, pois não são membros duplos, como mão, pé e olho. A duplicidade aqui é justamente para anexar a ideia de luta entre os próprios membros.
Jesus queria explicar que há uma luta, por isso um membro contra o outro. Um olho bom e um olho se desprendendo em trevas.
É muito importante notarmos a concordância nominal no singular. Uma pessoa que “cortasse” sua “mão”, não estaria somente privando alguma vontade deste membro, mas estaria se tornando fraca aos olhos do mundo. Sim, o mundo vê os cristãos que lidam com suas vidas diante de Deus como “pessoas mutiladas”. Verdadeiros mancos e aleijados.
É desta forma que somos vistos por esta era do mal. Isso não reflete muito bem o desleixo e o desprezo que constantemente recebemos do mundo?
O cristão que se consagra a Deus está definitivamente sendo visto como um ser deficiente aos olhos do mundo. As pessoas nos veem como aleijados e paralíticos.
Oh! Quão bom sermos assim desprezados, sermos assim considerados. Afinal, deveríamos ser como ovelhas destinadas ao matadouro. Mas, ao mesmo tempo, quão precioso, são aos olhos de Deus estes crentes que negam suas paixões. Cada olho, de um par, negado, é uma visão ganha diante do Senhor!
Ele procura esses que negaram um dos seus membros duplos pelo poder do Espírito de Cristo, conformados aos sofrimentos do Senhor, para, então, depositar sobre esses sofredores que preferem as “perdas” de Cristo nesta era, para ganhar Suas riquezas insondáveis na era que em breve se implantará. Esses “deficientes, mutilados” são os que de fato são energizados pelo Senhor. Os que se propõe a serem vasos úteis nas mãos de Deus. Desprezíveis e fracos aos olhos do mundo, mas grandes diante do Senhor deles.
Os “caolhos” do Senhor, os monofthalmos que só tem um olho e este para o Seu Senhor, tendo o outro olho julgado pela cruz, negam por amor a Cristo as paixões deste mundo. Não vivem tudo o que poderiam viver. Não veem tudo que poderiam ver, ainda que pudessem o fazer sem pecado. Não temem a escuridão de um de seus membros oculares, para então verem na Luz do Senhor com o olho que lhes sobraram.
Quão belos sãos esses sofredores de Cristo, os que perdem aqui. Os “eunucos” do Reino (Mt 19).
Poderia haver os dois olhos para o Senhor, mas quando isso não é possível, pois há um “se”. Se teu olho… Que seja um olho que veja o Bendito Homem de Dores que abandonou Sua glória e preferiu sofrer por nós. Que neguemos tudo o que for necessário por Ele. Que aprendamos com Sua dor, com Seus direitos negados, com Seu desejo pela dor, devido ao seu êxtase de Amor por seres caídos dos quais Seu Pai tinha o desejo de recuperar.
Sejamos deficientes aos olhos do mundo, vistos como fracos e pessoas que não fazem uso do que podem. Os que não pecam à vontade. Aqueles que não aproveitam a vida. Aleijados e mancos. Oh! Como isso é belo e grande! Quão gracioso é nosso Senhor permitir que possamos assim, como peregrinos fracos, mas conscientes de que essa jornada é passageira e que, ela não irá nos deter, que arranquemos mãos, olhos e pés.
Estes são, então, os 3 aspectos aplicados à experiência que temos diante do Senhor com nossos membros duplos. Detalhes; Luta; Fraqueza.
“A candeia do corpo são os olhos. Se estes, pois, forem simples, todo o teu corpo será luminoso; mas, se forem maus, todo o teu corpo ficará às escuras. Se, portanto, a luz que há em ti são trevas, quão densas são as trevas!”
—Mateus 6.22–23 – tb.
Nesta passagem, percebam que os membros da visão estão sendo considerados no plural. Neste instante, não há o retrato da luta; aquilo que era um detalhe, venceu; alcançou o olho são; o olho que ainda estava bom; os dois, neste momento em diante, estão na escuridão. Por isto, o Senhor diz não ser possível servir dois senhores logo em seguida no versículo 24. A candeia do corpo está corrompida, agora os dois olhos são dignos da GueHenna.
Servir dois senhores reflete a luta vencida, note que o Senhor não declara o fracasso por servir um dos senhores e abster-se do outro, mas sim, em permitir haver dois senhores. O fracasso dos olhos se dão na relativização, e não na exclusividade; ter dois senhores é tão errado quanto servir somente o senhor que não é nosso Cristo. Servir exclusivamente o senhor do mundo ou do dinheiro como é chamado (Mamon) é tão errado quanto servir ecumenicamente Mamon e Cristo.
A falha se dá nas trevas da candeia, que são os olhos. Eles são a lâmpada; ela se escureceu e atingiu o corpo, este em trevas está licenciado a fazer o que a lâmpada antes via e proibia, mas que agora não vê; o corpo praticará o mal na escuridão. Por esta razão que o Senhor dizia dos que gostavam de suas, próprias, obras (Jo 3.19), como aqueles que odiavam a Luz que era Ele em pessoa, porque suas obras eram más.
Jesus era como os olhos que capacitavam a ver as obras más, mas os que não foram quebrados pelo Senhor não gostam desses olhos; eles são os olhos que julgam suas obras. Quando nossa vida discipular se encontra em uma situação conflitante, um dos olhos já começa clamar seus direitos, pecaminosos ou não. Mais tarde esses direitos chegam ao olho bom, e agora os dois olhos mergulhados na escuridão não podem mais cuidar do corpo; o corpo do cristão, certamente, abraçará o pecado na escuridão que se lhe tornou conveniente.
Quando os olhos são mencionados no plural não há um retrato de luta ou de uma vida sofrida vivendo como um peregrino neste mundo sem fincar as estacas, mas de um resultado já evidente, que será refletido no corpo, e as trevas serão tão terríveis que este discípulo colocará um outro senhor nessa equação ainda que não abandone totalmente o seu Senhor Redentor, terá outro kyrios que o levará a relativizar sua vida cristã. Isso seria uma espécie de idolatria velada. Quão importante seria mantermos a pureza de nossos olhos para exclusivamente servirmos o Único Kyrios1.
Olhos no plural são o resultado tanto do bem quanto do mal. Do mal pois aceito a escuridão; do bem, pois pelo fato do olho bom me obrigar a alijar o olho mau, eu venço essa batalha e, portanto, o olho crucificado fica subserviente ao olho da luz. Assim, os dois olhos são de fato a candeia do corpo do discípulo do Senhor.
Olhos refletem isto: a vitória ou derrota. O Senhor diz que eles devem ser simples. Certa vez o salmista Davi disse que não procurava coisas grandes demais para ele (Salmo 131). Ainda que ele fosse o rei de Israel, ele sempre se pôs a ser pequeno.
Hoje, somos facilmente vencidos por desejos de grandeza. Paulo, também disse que deveríamos seguir o exemplo de humilhação do Senhor (Fp 2), que ele (próprio Paulo) passou a seguir. Para Paulo, a partir de então, tudo se tornou esterco, exceto o amar e servir a Cristo carregando no seu corpo as marcas de JESUS.
“Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho e, então, verás claramente para tirar o argueiro do olho do teu irmão. ”
—Mateus 7.5 – tb.
O olho no singular no aspecto do julgamento também é mencionado na Bíblia. Nosso Senhor destaca isso conforme Mateus 7.5, dizendo que olhos danificados, ou com problemas, não conseguem fazer o julgamento correto. E que, geralmente, esses julgamentos são desproporcionais. Lembremos novamente de João, ele em seu exclusivismo, julgou o irmão expulsor de espíritos maus. A visão do filho do trovão estava distorcida porque um dos teus olhos estava sem discernimento.
Ele não via que para o Senhor o mais importante não era pertencer ao mesmo grupo, e sim compreender que “quem não é contra nós é a favor de nós”. Esse “nós” dito pelo Senhor era uma expansão muito maior que um grupo de 12 ou 70. Era o próprio Corpo Místico de Cristo.
O Senhor ao mencionar um dos olhos a ser arrancado em prol do Reino em Marcos 9.47 é um retrato da realidade da comunhão dos filhos de Deus nesta era, esse olho com uma trave vai proclamar juízo errado e vai trazer práticas exclusivistas condenáveis, que não restará outra sorte que não seja o trato na GueHenna.
Outro aspecto, relevante, do olho no singular se dá na objetividade; por vezes, essa condição será requerida na Palavra de Deus, e, é justamente, o que acontece na parábola dos trabalhadores da vinha.
Como já mencionamos de uma maneira geral essa trama, vamos apenas considerar a resposta do dono da vinha ao pagar o combinado.
“À tarde disse o dono da vinha ao seu administrador: Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos e acabando pelos primeiros. Tendo chegado os que tinham sido assalariados cerca da undécima hora, receberam um denário cada um. Vindo os primeiros, pensavam que haviam de receber mais; porém receberam igualmente um denário cada um. Ao receberem-no, murmuravam contra o proprietário, alegando: Estes últimos trabalharam somente uma hora, e os igualaste a nós, que suportamos o peso do dia e o calor extremo. ”
—Mateus 20.8–11, tb
A reposta do proprietário da vinha aos trabalhadores foi essa:
“Mas o proprietário disse a um deles: Meu amigo, não te faço injustiça; não ajustaste comigo um denário? Toma o que é teu, e vai-te embora; pois quero dar a este último tanto como a ti. Não me é lícito fazer o que me apraz do que é meu? Acaso o teu olho é mau, porque eu sou bom. Assim os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos.”
—Mateus 20.13–16, tb, grifo nosso.
Olho aparece aqui, mas a ideia não é retratar apenas uma situação subjetiva como a negação de um olho que faz tropeçar, mas sim, do olho como forma de ver e interpretar uma ocorrência. É a expressão de uma visão geral que, neste caso, se alojava na mente dos primeiros trabalhadores da vinha.
Essa visão é objetiva, ou seja, a forma geral de ver as coisas. As ações do Senhor não segue uma lógica convencional. O Senhor nunca será injusto, mas também nunca seguirá as convenções que nos acostumamos, que é a de levar vantagem ainda que houvesse uma prerrogativa “justa” como ter trabalhado mais. O problema é que se o Senhor oferecesse a mais aos que trabalharam mais, fugiria do combinado, o que resultaria, na verdade, em injustiça.
O que Ele nos ensina aqui é que não pode haver injustiça ao mesmo tempo em que a misericórdia aparece para exceder os julgamentos humanos. E de fato excedeu. A passagem quer dizer que a justiça se manteve ao passo que a bondade também. Ele conseguiu ser Justo e Misericordioso na hora de recompensar. Não à toa que, em suas bem aventuranças, ele diz para sermos misericordiosos, porque encontraríamos ela no futuro se precisássemos, e é bem provável que precisaremos (Mt 5.7).
O proprietário que é o próprio Senhor demonstra como é Sua forma de agir, ao mesmo tempo que, Ele diz como é Seu coração. Os trabalhadores são os cristãos verdadeiros que serão recompensados, isso não é graça, pois salário vem de trabalho e, de forma alguma, é gratuito; no entanto, o Senhor excede em bondade e manda o anjo (o administrador) dar a mesma recompensa, apesar de os últimos terem trabalhado menos que os primeiros a serem chamados.
Importante notar que os últimos trabalharam menos, não por preferência deles, mas porque não houve mais tempo para continuar o trabalho. O que indica que o dono da vinha sabia da intenção dos últimos trabalhadores, pois Ele é o mesmo que sonda os corações, mas como o fim da era haveria de chegar, então o trabalho se encerrou e sua misericórdia encontrou a rota dos sinceros trabalhadores. A intenção sincera e o desejo do coração sempre serão contados por Aquele que tudo pode ver onde tudo está descoberto aos seus olhos.
Nossa visão tem que ser uma visão de acolhida, de inclusão e de comunhão com os santos irmãos, ainda que eles sejam fracos e tenham chegado bem mais tarde à fé cristã. Paulo, ao saber dessa importância pede para que sempre enxerguemos os demais irmãos acima de nós mesmos (essa é a lição da humilhação de Filipenses 2), para que depois a visão da bondade não se perca no meio do caminho e isto não seja um tropeço naquele Dia.
Como o Tribunal da Casa de Deus nos revelará tantas coisas fora da nossa órbita humana de ver! O nosso ponto de vista não é nada diante da bondade do Senhor. Que Ele seja glorificado e que sua misericórdia de fato exceda o juízo, e que nós sejamos humilhados diante da Luz de Sua bondade.
“Se o teu olho te servir de pedra de tropeço, arranca-o; melhor é entrares no reino de Deus com um só de teus olhos, do que, tendo dois, seres lançado na Geena.”
—Marcos 9.47 – tb, grifo nosso.
Que bom trabalho fizeram Bíblias como Tradução Brasileira, Bíblia de Jerusalém, Bíblia TEB, Bíblia Peshitta e a Bíblia Textual. Pois, essas versões não colocaram simplesmente a palavra latina “inferno” no lugar da expressão GueHenna.
A palavra “inferno” geralmente, devido ao imaginário popular herdado da Idade Media e da obra clássica: “A Divina Comédia”, de Dante, é vista como o lugar da condenação, aquela mesma condenação do Juízo Final. O lugar onde estarão o Diabo e seus anjos depois dos Mil anos.
Ainda que a palavra do latim signifique regiões inferiores, ou regiões abaixo, ou abissais, atearam fogo nesta palavra antes do tempo, como se a condenação em um inferno de fogo viesse antes do Trono Branco. Assim, quando a vimos, obrigatoriamente, de forma quase que automática, inserimos uma cláusula lógica: “são incrédulos ou falsos crentes”, pois nenhuma ovelha se perderá. Essa falha se dá pela sentença inferno.
Como essa palavra, por essência, acaba se tornando algo difícil de explicar, seria melhor usar o termo original.
Sabemos que haverá a condenação no Lago de Fogo, mas tal evento se dá após o Julgamento do Trono Branco, e se entendemos nessas passagens que GueHenna é o mesmo que o Inferno, então i) estaríamos colocando crentes neste lugar, pois as palavras de Marcos 9.43–47 foram dirigidas a discípulos; ii) e estaríamos dizendo que essa experiência acontece antes do Juízo Final, o que contrasta a sequência bíblica das eras.
Portanto, somos forçados e rendidos a admitir que pode ser algo diferente do que imaginamos quando a GueHenna é aplicada a crentes.
Geralmente, as Bíblias Almeidas e King James — embora sejam boas Bíblias, entendemos que foi um erro elas optarem pela palavra latina para estas porções — traduzem tanto a expressão Hades quanto GueHenna para inferno ou morte.
Seguramente, isso incorrerá em erro, pois a mente do cristão já envolvida no vício da dicotomia entre céu e inferno, ela não consegue perceber detalhes que ficam escondidos.
Apesar de existir o Lago de Fogo e o Céu, há também, por exemplo, o lugar intermediário onde os mortos estão custodiados, o Sheol (hebraico) ou o Hades (grego), e há dentro do Hades ou Sheol (como preferir) o paraíso de Abrahão. E, também, ao que tudo indica, um local de tratamento dos judeus que falharam em relação à Lei e a forma de lidar com os pobres (Lc 16.19).
Haverá também os locais (Prisão [Mt 5.26], Verdugos [Mt 18.34], Observação do Reino [Lc 13.28] e Trevas Exteriores [Mt 25.30]) de tratamento dos cristãos quando estes forem afastados do Reino Milenar no julgamento do Tribunal de Cristo, devido às suas derrotas que configurarão em um trato por parte do Pai de Família no período milenar.
A palavra GueHenna em Marcos é aplicada a cristãos, não somente pelo contexto onde começa com João e depois com os crentes que falhariam em negar mão, pé e um dos olhos, mas também pelo versículo 49. Que é avassalador!
“Pois cada um será salgado com fogo”
—Marcos 9.49 – tb.
A Bíblia revela que este “cada um”, ou como em outras versões “todos”, está abrangendo, por um lado que sua aplicação é segmentada a discípulos; e por outro, que contém a inclusão de todos os crentes, não havendo qualquer exceção, ficando apenas por diferenciação quando serão salgados. Alguns já o são agora com o fogo das nossas ardentes provas (1Pe 4.12), outros terão que ser depois. O fato é, TODOS serão salgados com fogo.
A ocorrência que fez o Senhor começar falando do copo d’agua fria, dos tropeços dos pequeninos, até o alijamento de um dos membros conflitantes do corpo, tinha por objetivo tratar a experiência de vencer a falha do exclusivismo que, poderia ser reconhecida na análise futura de Deus como uma derrota a qual faria que os membros que não foram devidamente tratados nesta era presente fossem na, futura.
JESUS chama isso de “sal”, e diz que todos os filhos de Deus serão salgados. O meio que fará este sal ser produzido no discípulo é o fogo.
Certa vez, Jesus disse em Mateus 5 que deveríamos ser luz do mundo e sal da terra, é importante notar que Ele mesmo faz uma distinção. A palavra luz do mundo se refere ao testemunho que o cristão daria por fazer a vontade do Pai, isso acarretaria em luz. O mundo receberia essa luz por meio dos cristãos; mas também o Senhor diz que deveríamos ser sal da terra; note que ele não diz sal do mundo, mas da terra. Se conciliarmos com Marcos 9.50 saberemos que este sal se dá somente na comunhão dos filhos de Deus e não tem relação com o mundo.
O mundo não pode sentir o sabor dos filhos de Deus, somente um irmão pode tocar o sabor de outro irmão, isso é comunhão. O mundo não pode ter essa experiência, mas eles precisam saber que suas obras são más e, portanto, crerem no Senhor.
Por isso que para o mundo devemos ser luz, mas para a Igreja devemos ser sal. O mundo verá as boas obras dos filhos de Deus e glorificarão o Pai (Mt 5.16). Mas somente entre os irmãos poder-se-á sentir o sabor de Cristo na comunhão, e o sal tem essa finalidade. Se o filho de Deus perder seu sabor ele será lançado fora.
Por que a inclusão sal da terra? Porque essa é a dupla missão dos filhos de Deus, trazer luz para o mundo em trevas, e salgar os irmãos por meio do fogo (leia 1Pe 4.12) que eles recebem. Essa dupla operação deveria ser inseparável. Não posso ser apenas luz do mundo e não ter sal entre os irmãos; assim como não posso ter sal entre os irmãos e não ser luz do mundo.
Lembre-se que o mundo é diferente da terra; terra tem um lado positivo e requer a preocupação de Deus. Deus inclusive deseja que a terra descanse (2Cr 36.21). Deus prometeu a Israel a Terra Prometida e não o mundo prometido porque a Terra fala de riquezas orgânicas, não de riquezas exploradas, riquezas injustas, riquezas roubadas.
O mundo é a órbita de Satã, ele na tentação no deserto não ofereceu a terra, mas os reinos do mundo ao Senhor.
A Terra na verdade fala do próprio Cristo. Por isto que na questão da terra as coisas são positivas e na questão do mundo, negativas. A Terra é o Senhor; o Mundo é o Maligno. Na ambiência do Senhor temos que ter sal, neste caso a luz é dispensável, pois o Senhor é a própria luz, nós somos apenas portadores dela. Essa luz é o testemunho, e é o próprio Senhor.
Marcos 9.50 ainda traz um desfecho impressionante:
“O sal é bom; mas, se o sal se tiver tornado insípido, com que haveis de restaurar-lhe o sabor? Tende sal em vós mesmos e estai em paz uns com os outros.” (Marcos 9.50 – Tradução Brasileira).
Alguns intérpretes destacam o sal como a preservação da vida, por ser o recurso daquela época para que pudessem preservar a carne por mais tempo a fim dela servir de alimento em ocasião oportuna. É claro que não vou desconsiderar essa interpretação, mas aqui o Senhor Jesus deixa bem claro que a ênfase é o “sabor”. E como chama-se esse sabor, como devemos interpretá-lo? Jesus mesmo dá a interpretação: “tende sal em vós mesmos e estai em paz uns com os outros”. O sal é a paz! Sim, pois João tinha desencadeado uma atitude que representaria um rompimento entre irmãos.
Jesus fez todo aquele discurso e trabalhou toda Sua pedagogia para tratar, especificamente, daquela proibição que João fez em relação ao irmão expulsor de demônios.
Agir daquela maneira era não ter sal, pois não tendo sal não haveria paz. A lição de nosso Senhor era mantermos a comunhão e não rompermos com irmãos por não estarem no mesmo grupo que o nosso, ou no mesmo serviço, ou ministério. Era um alerta para não proibir àqueles que Ele mesmo não proibiu e que não eram contra Ele.
O perigo de manter olho de tropeço era ter essa visão exclusivista e descuidada que resultaria em i) dispensar os copos d’aguas que viriam e ii) e colocar-se contra aqueles que o Senhor aprovou, configurando mais tarde em uma resistência contra o próprio Senhor. Nunca nos esqueçamos, quem não é contra é a favor. E nunca nos esqueçamos que se lutamos contra o Corpo de Cristo lutamos contra o próprio Senhor.
O jovem Saulo resistia ao Senhor, mas ele só descobre isso no caminho de Damasco. Ao constatar que perseguir a Igreja era perseguir o próprio Jesus de Nazaré, ele mesmo, mais tarde, nas suas cartas foi o primeiro a dizer que a Igreja era o Corpo de Cristo.
Saulo fazer tal coisa, foi reprovável, e o Senhor interviu a favor de Sua Igreja, mas Saulo até então era um incrédulo. Quando ele se torna Paulo, ele mesmo, compreende quão grave era se opor ao Corpo de Cristo. Não nos esqueçamos que quando ele foi repreender o sectarismo que havia surgido na igreja em Corinto, ele não disse: “acaso está a Igreja dividida?!”. Mas, disse: “acaso está Cristo dividido?! (1Co 1.13)”.
Não sejamos responsáveis por resistir a algo que o Senhor não resistiu. Recebamos todo aquele que foi acolhido por Cristo por meio do Espírito Santo.
Se agirmos sem a devida “quantidade de sal”, depois de uma vivificação limitada (uma espécie de anterressurreição) para comparecermos diante d’Ele para julgamento (porém, sem a glorificação dos corpos ressurretos), e que, com este mesmo corpo vivificado, com os pés, mãos e olhos, seríamos — dependendo do agravo de nossas ações —reprovados, também, diante d’Ele; então seríamos salgados no fogo da GueHenna. Essa cena de uma hipotética derrota se dará de fato no retorno do Senhor em Sua Parusia para julgar a Casa de Deus em Seu Tribunal. Tal derrota poderá resultar em tratamento disciplinar divino na GueHenna.
Como é isso de fato? Não sei. Nem tampouco sei se este fogo é literal, pode ser que seja, pode ser que não, do mesmo jeito que o fogo de 1 Pedro 4.12 não é literal e o de Marcos 9.49, onde envolve todos os crentes, ao menos entre os vivos de hoje, também não é. Mas algo é fato nisso tudo, essa “GueHenna” não é a Segunda Morte, onde a ira de Deus cairá sobre todos que negaram crer no Seu Filho e morreram em seus pecados. Porém, é uma localização (ao menos quando é termo é aplicado a discípulos) perto da Segunda Morte (Hebreus 6.8 ).
Todavia, é um lugar que os dois olhos reprovados estarão, as duas mão caídas estarão e os dois pés que se apressaram a correr para o mal (cf. Provérbios 6.18), igualmente estarão.
Não é de se admirar que JESUS ao ensinar seus discípulos a não temerem os homens que tinham capacidade de matar o corpo mortal, mas não a alma imortal, deveriam temer a Deus que poderia pegar tanto o corpo quanto a alma e inseri-los na GueHenna (Mt 10.28)?
Quem poderia temer a Deus senão aquele que foi iluminado por Ele. Deus exigiria o Seu temor entre néscios dessa era? Entre descrentes e ímpios que não compreendem o princípio da sabedoria? Entre criminosos que matam apenas corpos e nada podem fazer com a alma? Obviamente que não. Os que temem são igualmente os creem. Portanto, se tinham que temer a Deus para não serem depositados na GueHenna, logo seriam passíveis de ir para lá. No entanto, nunca foi dito que a GueHenna deteria para sempre um filho de Deus (cf. Mateus 5.26).
Os tratos dos filhos de Deus reprovados se dão em corpos que entraram no estágio de glorificação, depois que compareceram no Tribunal de Cristo, mas que não atingiram o padrão mínimo requerido pelo Senhor a fim de que possam, ser glorificados e, reinar junto com Ele na era milenar.
Aquelas mãos, pés e olhos que foram reprovados e estão de agora em diante debaixo dos tratos divinos, deverão ser depurados por ações que só Deus sabe como serão. Compreender essa pedagogia com nossas limitações humanas só nos fará perder tempo com certos detalhes que não devem ser a observação mais vital. E essa obra não é para salvar ninguém, e sim, para provar que já são salvos, e agora estão debaixo da pedagogia divina nos devidos tratos do código de família.
Não é uma questão de ser condenado, mas disciplinado. A comunhão com os irmãos deve ser levada a sério, assim como muitas outras ações da nossa vida cristã, tais como a santificação e a consagração.
Qualquer visão distorcida, fará que dispensemos os mais variados copos d’agua fria que serão oferecidos, sem percebermos, em nossos desertos desta vida peregrina. O Senhor rememorará no Seu Tribunal, e se o fogo dessa presente era não foi suficiente para que tivéssemos o sal dos santos, então certamente a depuração vindoura fará seu devido ajuste em nosso caráter e pagaremos o último centavo certamente (Mt 5.26).
“Ela olhou para o fruto proibido (Gn 3.6). O ouvido é uma porta de acesso à alma; os olhos são outra; e Satanás empregou ambos. Ela olhou, assim como Cão olhou para nudez de seu pai, da mesmo forma que Ló olhou para as planícies verdes e bem regadas, da mesma forma como sua mulher olhou para a fumaça das cidades; como Esaú olhou para o prato de sopa; como Acã olhou para a barra de ouro; como Davi olhou para Bate-Seba. Esse olhar da mulher foi o primeiro olhar dessa natureza e sempre tem sido um olhar que causa destruição. Somente um olhar! Mas não terminou com um olhar somente! ”. (O Descortinar do Drama da Redenção p. 41 – Edições Tesouro Aberto).
— W. Graham Scroggie.